domingo, janeiro 22, 2006

Cá vai o segundo episódio do conto Albatroz...

"II – A Descolagem

Boquiabertos primeiro, incrédulos depois, os homens e mulheres de curiosidade estacionada no local, dividiram-se entre vivas e aplausos, apupos e esgares de desânimo. Mas a Alfredo pouco interessavam agora as reacções de terceiros, outrossim a passagem para a segunda etapa da sua aventura.

Não foi sem dificuldade que afastou os abraços e demais manifestações de afecto dos seus admiradores, até por fim instalar a sua Alice no melhor local do porão (com janela!). A si próprio reservou lugar na frente, preso a um sistema engenhoso de correias que o sustentariam no ar.

Com a ajuda de alguns elementos da turba e com a algazarra energética da criançada, a enorme estrutura foi sendo levada até ao precipício do topo da montanha onde se encontravam. O sol preguiçoso manifestava-se ainda com dificuldade nas primeiras horas da manhã, e foi só com o calor definitivo dos primeiros raios que foi dado o empurrão decisivo. Em Alfredo e nos que ficaram a respiração susteve-se, como se todos pertencessem ao mesmo organismo vivo. Devagar a ave ganhou vida ao planar suavemente sobre a extensa planície. Lá ao fundo, no cume da montanha, as pessoas em profundo silêncio eram cada vez mais pequenas na sua tristeza.

Alfredo esse folheava com prazer o livro da sua história e cada vez que pestanejava tinha medo de acordar de um sonho. O vento puxava-lhe os cabelos para trás e fazia drapejar as suas roupas como a uma bandeira. Depois de tantas noites perdidas acabou por adormecer momentaneamente e a aeronave começou a perder altitude.

A uma escassa centena de metros acordou por fim com a inquietude do cacarejo de Alice e de um golpe puxou algumas das cordas do seu engenhoso veículo e parou a queda iminente. Um suor gelado irrompeu-lhe do rosto à medida que ia ganhando altitude e deu-lhe que pensar tecnicamente, pelo que deixou de parte o aspecto trágico do sucedido.

A desvantagem de um planador é a fraca autonomia perante a energia insuficiente resultante do lançamento de um cume de uma montanha. Mais tarde ou mais cedo, mesmo aproveitadas à última molécula, as correntes de ar quentes e frias, que lhe sugeriam ou obrigavam novas manobras de sustentação e progressão, a sua aterragem tornar-se-ia inevitável. Por isto e porque com o pôr-do-sol caíam todas as horas do dia, e com elas a luz necessária a uma viagem segura, era preciso aterrar e para isso encontrar um bom local sem demora… O primeiro impulso tinha consumido bons quilómetros de distância, mas ainda assim insuficientes para chegar a uma nova cordilheira de montanhas. A única coisa com que podia contar agora era com bons prados para uma aterragem fofa…
Como um verdadeiro piloto manobrou a máquina, tão poderosa como dependente, e tocou finalmente terra depois de horas de viagem. Primeiro os pés em agitada correria prepararam o impacto e com o auxílio das rodas tudo se processou sem incidentes. A tempo ainda de, após desapertar as correias que o seguravam à máquina e de aconchegar no seu colo a fiel Alice, assistir com um suspiro profundo aos últimos fulgores laranjas do sol, assente na horizontalidade a um tempo desesperante e mágica da paisagem.
O sono chegou com a embriagante dança das chamas de uma pequena fogueira. Alfredo levantou-se da relva e instalou-se no porão onde algumas mantas o defenderiam do frio nocturno."

quinta-feira, janeiro 12, 2006

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Hoje segue o primeiro episódio de outro conto ilustrado (as ilustrações começarão a sair no final deste mês..) ainda com o nome provisório de "O albatroz".

"O albatroz

Episódio I – A construção

Havia naquela noite uma espécie de azul inquietante no céu, e Alfredo havia já vencido definitivamente o apelo do sono diário. A janela aberta deixava entrar o ar a um tempo frio e suave, real. Os olhos abertos ou fechados traziam a mesma imagem e o sonho começou a ser construído com a decisão de uma partida. Alfredo saiu de casa ainda descalço e correu pela terra gelada e áspera até ao barracão.

De uma arca retirou, preciso, um caderno antigo cheio de esboços e anotações. A palavra voar repetia-se com a angústia de quem se sente agrilhoado, como se a gravidade fosse um assustador algoz de capuz negro. Ao longo de extensas linhas intercaladas com desenhos perfeitamente geométricos projectava-se a construção de um enorme planador. Nesta história não entram tios viajantes desaparecidos ou avós lunáticos, apenas Alfredo anos antes de se decidir por uma vida normal. Mas esta era para ele tão pesada… Amanhecer, sim! Agora com a decisão tomada é preciso fazer os preparativos.

O Sol trouxe consigo um sorriso para cada um dos vizinhos que encontrou e a quem ia dando as suas gordas galinhas poedeiras, a quem entregava a guarda da sua casa, o usufruto do seu verdejante e leguminoso quintal, o sumo fresco dos frutos do seu pequeno pomar…

Ficou apenas com Alice, a galinha poedeira mais velha e de quem era acima de tudo inseparável.

Nos dias seguintes, fechado no barracão, distribuindo marteladas, ais, esgares, suspiros e gritos de contentamento, provocou na vizinhança uma curiosidade que só os mais pequenos se atreviam a satisfazer. Subiam furtivos pelas árvores até às janelas cimeiras fazendo a partir daí relatos atabalhoados de formas estranhas, faíscas e seres monstruosos. A confusão do passa-palavra era tal que no ajuntamento que por turnos se ia mantendo por perto, a verdade se perdia num sentimento de angústia e curiosidade. Um dos mais velhos a dada altura, enlouquecido pelo silêncio que entretanto se abateu, chamou a si a coragem necessária para enfrentar um louco e bateu insistentemente à porta do barracão.

Ao cabo de algumas tentativas Alfredo surgiu ao chamado, de rosto exausto e fúnebre. Sujo e magro contemplou desanimado os rostos dos seus vizinhos manifestamente preocupados, e aceitou um pão e um frasco de mel com visível apetite. Fechou-se novamente com um sorriso amargo de agradecimento e voltaram à carga as violências acústicas do seu trabalho. Assim movido a pão e mel continuou a sua jornada contínua.

Na frente do seu barracão estava montada uma verdadeira infra estrutura para tornar confortável a estadia de quem por si velava, cadeiras, agasalhos, lâmpadas de azeite, um pequeno depósito com broas de milho, mel, frutas e vários garrafões de hidromel.

Trinta e dois dias depois a parede da frente do barracão começa a ceder e acordando progressivamente as gentes vizinhas e os visitantes de outras aldeias deu a conhecer a gigante e imponente construção aeronáutica…

À sua frente, de chapa reluzente, desenhava-se uma ave enorme de asas articuladas. De um profundo porão, por hora apenas emanava um vazio negrume. Um tímido par de rodas prometia aterragens forçadas mas servia para deslocar a enorme massa metálica estruturada por madeira. (fim do primeiro episódio)"

terça-feira, janeiro 10, 2006


Olha! Plantei uma árvore em Ferreira do Zêzere no dia 1 de 2006! Se tudo correr bem dar-nos-á pêras abacate um destes dias... Na fotografia está a Ana Filipa (a madrinha da árvore!), uma das minhas sobrinhas e grande amante da natureza. Dentro em breve levarei o Rodrigo (o meu sobrinho mais pequenino!) a plantar outra igual, assim que ele conseguir dizer pêa-abate ou algo similar.

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Hoje publico a parte I de um conto infantil que escrevi no ano passado...

"Parte Um
Salvador era um miúdo calmo e sossegado. Pequeno e franzino impressionava pelos seus olhos muito negros e brilhantes como quem está, mesmo quando alegre, sempre à beira de chorar. Os seus cabelos também muito escuros perdiam-se em ondas rebeldes e encaracolavam caprichosamente nas pontas, fazendo com que a sua mãe perdesse muito tempo e paciência a dominá-lo antes de o levar para a escola.
Nos dias de Setembro em que a escola se aproxima e as tardes ficam mais pequenas acontecia ver-se o pequeno Salvador profundamente aborrecido encolhido a um canto do quarto. Os seus pais preocupavam-se e prontamente o tentavam animar brincando com ele e trazendo-lhe mais presentes. O seu rosto animava-se por momentos ao folhear um livro de ilustrações novinho em folha, ou carregando nos botões de um brinquedo a pilhas, mas logo o seu rosto se contraía e tudo se tornava novamente enfadonho. Às vezes Salvador tinha ideias na sua cabeça e empenhado pegava em papéis e tintas para levar a cabo os respectivos projectos, mas quando olhava à sua volta encontrava a sua ideia já transformada em brinquedo pelo que só lhe restava desistir e limitar-se a brincar. Na verdade nas paredes do seu quarto havia muitos desenhos e bonecos pendurados. Dos móveis transbordavam outros tantos bonecos, carros e jogos formando uma paleta interminável de cores.
Passavam-se dias longos, de tardes curtas e noites compridas e a tristeza andava sempre perto do rosto de Salvador como uma nuvem opaca. Um dia Salvador, pequenino, sentou-se num banco e apoiado no parapeito olhou longamente para o jardim sobranceiro à sua janela. O Outono espalhava já os seus matizes quentes pelas árvores e por todo o lado se respirava cor de laranja. O tempo ainda estava quente e pela janela via-se cair de vez em quando uma folha de uma árvore. No meio do ainda e sempre verde da relva, surgiam em pedra dois ou três sólidos bancos onde pousavam algumas pombas preguiçosas. Também havia uma fonte onde os pardais se banhavam e onde todas as pessoas podiam beber água fresca. Era de pedra, aqui e ali esverdeada pelo musgo, e tinha uma daquelas torneiras caprichosas que lançam a muitos metros de altura um repuxo divertido e de tal forma inocente que dá tempo a que se fuja antes da água cair.
Da rua vêem-se várias casas muito bonitas, umas velhas, outras novas, mas todas elas cheias de personalidade, decerto reflectindo a dos seus habitantes. Do rés-do-chão da casa mais nova, assoma o nosso Salvador de nariz colado ao vidro, desenhando pequenas figuras invisíveis na janela."

sábado, janeiro 07, 2006


Mais um trabalho para a imparável GEZU! Alex it's allways a pleasure!

http://www.gezuskateboards.com

Olá amigos. Para começar a minha senda no mundo dos blogues partilho um desenho do jogo dos "galões galões", explico: quando vamos tomar café (eu bebo galões!), eu o João e a sílvia desenhamos sob indicações pré-definidas várias personagens... o tema deste era "monstros". A propósito esta inominável criatura é comandada por um verme parasita, aquele ali em cima a babar-se... Entretanto vou convencê-los a publicar aqui alguns desenhos...